Free cookie consent management tool by TermsFeed

Notícias

1º de Maio: A Nutrição e a Saúde do Trabalhador


Data de Publicação: 30 de abril de 2024
Crédito da Matéria: Assessoria de Comunicação CRN-2
Fotos: Canva.com
Fonte: Luísa Rihl Castro (CRN-2 4419)


1-de-maio-a-nutricao-e-a-saude-do-trabalhador

Primeiro de maio, Dia Internacional do Trabalhador, é uma data na qual, tradicionalmente, a classe trabalhadora apresenta suas reivindicações por melhores condições de vida e trabalho. A saúde dos trabalhadores é um tema importante e que tem sido cada vez mais debatido. Entrevistamos a nutricionista Luísa Rihl Castro (CRN-2 4419)*, que tem experiência na área de alimentos, alimentação coletiva e comportamento alimentar de trabalhadores.

 

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma alimentação adequada pode elevar em até 20% os níveis de produtividade nacional. Como se dá essa relação entre produtividade e alimentação?

Essa foi uma pesquisa e conclusão da Organização Internacional do Trabalho (OIT)*, vinculada a ONU, e que publicou um relatório sobre a relação entre a produtividade e a alimentação dos trabalhadores. Foi identificado que, trabalhadores com consumo e hábitos saudáveis, não só de alimentação, mas de um estilo de vida saudável, teriam um rendimento melhor. No caso da alimentação, a gente tem que pensar: o que será que esses trabalhadores/empresas devem ter feito em relação à alimentação para aumentar a produtividade? E, no Brasil, de onde vem as recomendações que podem auxiliar na organização da alimentação? A resposta é simples: de algo que já conhecemos há 10 anos, o nosso Guia Alimentar para a População Brasileira. O guia descreve Dez Passos para a Adoção de Hábitos Saudáveis e Adequados em relação à nossa alimentação. O primeiro passo é a regra de ouro do Guia: “Fazer de alimentos in natura ou minimamente processados a base da alimentação”.

Quando a gente passa a pensar dessa forma, a gente começa a escolher e organizar melhor a nossa alimentação. Aquele trabalhador que prioriza, na sua ingestão, frutas, grãos, cereais, carnes, legumes, verduras, raízes, tubérculos, ovos, leites e derivados, harmoniosamente e com variedade; e que consegue utilizar óleos ou gorduras, sal e açúcar em pequenas quantidades ao temperar e cozinhar alimentos, consegue render muito mais no seu trabalho, adotando uma rotina de saúde, pois pensa também na atividade física, pensa em ter sono de qualidade, na hidratação diária... ou seja, adota o “combo” do estilo de vida adequado: alimentação, atividade física, sono, hidratação.

Mas o ponto chave é: ok, eu sei o que eu tenho que fazer, mas COMO eu posso fazer? E por que não faço? Comportamento...O nutricionista, usando ferramentas das ciências comportamentais e atuando como um agente de mudança de comportamento, ensina como mudar hábitos, como o indivíduo pode analisar os seus comportamentos alimentares e até mesmo pode ajudar a entender os papeis da comida na vida, e como trabalhar com seus pensamentos sobre a comida e sobre comer. Lembrando que, sempre que for necessário, o profissional psicólogo participará junto deste processo, para tratamento de demandas específicas e que estejam relacionadas à alimentação.

Mas não podemos deixar de falar da responsabilidade das empresas, é claro. Não basta o trabalhador ter a noção de que pode melhorar e a empresa agir de maneira contrária, oferecendo uma alimentação inadequada, não olhando para as questões voltadas à qualidade de vida no trabalho.

*A missão da OIT é promover oportunidades para que homens e mulheres possam ter acesso a um trabalho decente e produtivo, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade. Para a OIT, o trabalho decente é condição fundamental para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável.

E como as empresas podem promover saúde alimentar e nutricional no ambiente laboral?

A empresa é um ator fundamental para que esses 20% apareçam. Atualmente, algumas empresas já valorizam o “combo” da saúde que falei anteriormente, ou seja, adotam e oferecem programas de saúde e bem-estar, com métodos que auxiliam o trabalhador a pensar na sua saúde. Um exemplo são plataformas digitais que ajudam a controlar a hidratação, que estimulam a prática de atividades físicas e que incentivam a alimentação adequada. De acordo com a Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho (SST), para cada 1 Euro investido em SST, o retorno é de 2,2 Euros. Observa-se também, além de resultados quantitativos, ganhos com qualitativos, que contribuem para retenção de talentos e a melhora do clima organizacional.

Quando temos participação ativa, tanto por parte da empresa quanto dos colaboradores (o trabalhador e suas prioridades com alimentação, a qualidade do seu sono, a sua atividade física – e de outro, as empresas preocupadas com a saúde dos seus funcionários) não tem como não pensar que teremos o aumento da produtividade. Da mesma forma, diminuição da rotatividade, das taxas de absenteísmo, de atestados... Um dado interessante é do relatório World Employment and Social Outlook 2023: The Value of Essential Work, que destaca sobre as más condições de trabalho, que agravam ainda mais a rotatividade e a escassez de mão de obra, comprometendo a prestação de serviços básicos. Segundo o relatório, é necessário melhorar as condições de trabalho e investir mais nos setores-chave como alimentação, saúde e outros setores importantes para aumentar a resiliência econômica e social a choques.

Enquanto nutricionista, a gente precisa começar a pensar na forma em que podemos auxiliar as empresas a proporcionarem mais qualidade de vida aos seus funcionários; os trabalhadores poderão se sentir motivados e valorizados, rendendo muito mais nas suas funções laborais. Se pensarmos em programas de qualidade de vida, uma das abordagens pode ser o atendimento do nutricionista com o olhar à saúde do trabalhador, junto com o psicólogo, assistente social e médico do trabalho, no ambulatório, por exemplo. As empresas também podem organizar eventos, workshops, palestras e oficinas direcionados à saúde do trabalhador. Através das Comissões Internas de Prevenção de Acidente e Assédio (CIPA+A), essa proposta dos eventos já é uma realidade.

Quais as legislações mais importantes sobre saúde nutricional e alimentar dos trabalhadores?

Em relação às legislações, a gente não pode deixar de falar da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), que por meio de um conjunto de políticas públicas, propõe respeitar, proteger, promover e prover os direitos humanos à saúde e à alimentação; da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional - LOSAN (Lei nº 11.346 de 2006), que descreve a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) como “a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”; e da Lei nº 8.080 de 1990, Lei do SUS, que “dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências” – conhecida como Lei Orgânica da Saúde – e que inclui a saúde do trabalhador no âmbito do SUS. Ou seja, legislações também dos trabalhadores.

A lei mais específica sobre a alimentação do trabalhador é a Lei do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), instituído lá em 1976. Desde então, foram feitos ajustes de parâmetros nutricionais importantes e o Programa tem sido atualizado. O PAT assegura, além de qualidade nos cardápios, alimentação do trabalhador dentro da empresa, seja no refeitório, no ticket, ou nas cestas básicas. Assegura também campo de trabalho para os nutricionistas, pois este é o único profissional legalmente habilitado a responder tecnicamente pelo PAT. Ah, lembrando que precisamos cuidar de quem cuida...o nutricionista é também um profissional trabalhador e que precisa ser valorizado, ser cuidado.

Como a alimentação inadequada pode afetar a saúde e a segurança do trabalhador?

A alimentação inadequada pode promover queda de rendimento, de produtividade, como já falamos..., mas também, compromete a qualidade de vida como um todo. Como? Através de déficits de atenção, cognitivo, de motivação, de disposição. Menos nutrientes, ou nutrientes inadequados, enfraquecem, não fornecem energia, não contribuem para a saúde mental (hoje já sabemos da relação eixo intestino-cérebro). Em médio ou longo prazo, acabam se desencadeando outras questões: se me sinto fraco, eu produzo menos, eu me sinto incapaz, eu me deprimo, eu me estresso com facilidade, eu não tenho apoio, eu não sou visto pela empresa. Doenças ocupacionais, como burnout, depressão e ansiedade já são realidade na vida deste trabalhador, infelizmente. Dados da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT), revelam que, aproximadamente 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a síndrome de burnout, uma doença ocupacional reconhecida e classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022.

Considerando que uma pessoa passa, em média, 8h por dia no trabalho, como manter uma alimentação saudável?

Precisamos considerar alguns fatores, por exemplo, os diferentes setores de trabalho, as pessoas que levam sua comida, as que saem para comer, as que usam refeitório... Por exemplo, as marmitas, que antes eram vistas como uma alimentação “sem glamour”, já são realidade na vida do trabalhador. E com muito orgulho, graças a Deus! Estamos seguindo o sétimo passo das recomendações do Guia Alimentar: “Desenvolver, exercitar e partilhar habilidades culinárias”, pois, para preparar a marmita, precisamos escolher, comprar, selecionar os alimentos.... Então, que o trabalhador consiga, dentro de suas possibilidades, preparar a sua refeição, fazer boas escolhas, já que é uma forma de manter adequada sua alimentação. Algumas recomendações são importantes, como a forma de transporte desse alimento, a temperatura adequada, onde vai acondicionar essa marmita quando chega no trabalho, o tipo de pote... enfim, cuidados higiênico-sanitários fundamentais para o sucesso dessa refeição.

Para quem frequenta o refeitório, que procurem incluir no seu prato todos os grupos alimentares que o Guia faz referência: vegetais, legumes, tubérculos, raízes, frutas na sobremesa, os cereais como milho, arroz (que se for integral, melhor, pois incrementa a quantidade de fibra no prato), feijões, lentilhas, uma porção de proteína animal que seja mais magra, como carne de gado, frango ou peixe...vegetais assados e sopas agora no inverno, são boas opções também.

Uma coisa que eu acho bem legal e importante que as empresas com restaurantes corporativos já fazem (ou poderiam começar a fazer!) é a promoção de programas de educação alimentar e nutricional: mural, vídeo, painel, banner, ou alguma outra forma que mostre e sensibilize o trabalhador a montar, por exemplo, um prato legal, com boas e adequadas porções dos alimentos; receitas com substitutos do sal; com aproveitamento completo dos alimentos, como talos e cascas; campanhas sobre desperdício de alimentos...

E para as pessoas que saem para comer: seguir o passo número 9 do Guia Alimentar: “Dar preferência, quando fora de casa, a locais que servem refeições feitas na hora”. A recomendação é procurar por restaurantes que tenham buffets, onde possa ser feita uma escolha melhor; procurar evitar as redes de fast foods. Importante é variar...e que se saiba: restaurantes do estilo self-service tendem a oferecer mais qualidade nas refeições.

O trabalho é fundamental para a vida do ser humano, no que diz respeito à dignidade, a desenvolvimento e à capacidade de evolução... eu sou fã desse tema... precisamos comemorar essa data, nossas conquistas através do trabalho! E resumindo: organização, planejamento, escolhas adequadas com base no nosso Guia Alimentar, valorização e cuidado, podem ser benéficos para todos nós: trabalhadores e empresas.

 

*Nutricionista formada pela Unisinos (2000), mestre em Ciências Médicas pela UFRGS e doutora em Psicologia pela PUCRS, Luísa é atualmente coordenadora do curso de Nutrição da UNISINOS (Campus Porto Alegre) e Coordenadora Acadêmica do Projeto Social e de Extensão Banco de Alimentos.

 

Referências e materiais de apoio:

BRASIL. Ministério da Saúde. Guia alimentar para a população brasileira: promovendo a alimentação saudável. Normas e manuais técnicos: Brasília, 2014. 

Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – LOSAN (Lei nº 11.346)

Lei Orgânica da Saúde (Lei Nº 8.080, de 19 de setembro de 1990)

MARTÍNEZ GARCÍA, Rosa María et al. Estrategias nutricionales que mejoran la función cognitiva. Nutrición hospitalaria, v. 35, n. SPE6, p. 16-19, 2018.

Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN)

Programa Alimentação do Trabalhador (PAT)

World Employment and Social Outlook 2023: The value of essential work. Geneva: International Labour Office, 2023.


topo